INSTITUTO BRASILEIRO DE MUSEUS

Museu Victor Meirelles

n. 1 – Entrevista

Revista Eletrônica um ponto e outro nº 01 – Leonílson

Revista do programa de exposições do Museu Victor Meirelles

Entrevista

Conversa na primeira
pessoa do plural

por Néri Pedroso

Ricardo Resende
Ricardo Resende

A transformação de um museu em Fortaleza (CE), a primeira exposição de Leonilson no sul do Brasil, o exercício curatorial e a crítica são os temas desta conversa com Ricardo Resende realizada na véspera da abertura da mostra “Deserto”, no Museu Victor Meirelles, em Florianópolis. Com apenas 44 anos, ele dirige há dois anos o Museu de Arte Contemporânea Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, em Fortaleza, e, em São Paulo, coordena, desde 1996, o Projeto Leonilson. No resultado, um depoimento sincero e despojado sobre diferentes facetas da arte brasileira. Resende revela os cuidados adotados na responsabilidade de valorização da obra e da memória de um dos mais expressivos nomes da “Geração 80”, conta estratégias de caráter institucional que ajudaram a dar melhor visibilidade não só ao Leonilson, mas também ao Museu Dragão do Mar e, quando convidado a explicar os resultados, encantador – fala sempre na primeira pessoa do plural. “É fruto do trabalho de uma equipe”, garante. Para ele, é impossível pensar sozinho na atualidade. É muito melhor várias pessoas, vários olhares, confluindo para uma coisa só. Com muito artista, muitos produzindo e o mundo muito grande, é impossível uma única pessoa dar conta dos desafios. “É preciso dividir o serviço, porque fica mais rico, há mais trocas e mais chances de dar certo”, sugere.

N. – Em Leonilson é possível dissociar o homem do artista?

Ricardo Resende – Com certeza, não. É uma obra autobiográfica, ele está o tempo todo falando de si mesmo. Ali é o despertar de um homem muito sensível, muito emotivo, frágil. Na exposição “Deserto”, no Museu Victor Meirelles, percebe-se que esse homem já surge bem no começo da obra, quando já aparecem os primeiros textos, as primeiras preocupações com a sociedade, a cidade, os relacionamentos. A doença só ativa ainda mais o ser sensível, emotivo, frágil. A doença vai fragilizá-lo ainda mais para esse olhar de mundo que tem em sua obra.

N – Como é fazer a curadoria de uma obra aberta, uma obra não concluída. Qual a diferença em fazer uma nesta circunstância e uma de um artista com uma obra já sedimentada?

Resende – É muito mais fácil fazer uma curadoria de um artista já falecido com uma obra já completada. Você tem um olhar mais livre. É mais complicado quando o artista está vivo, quando é preciso lidar com ele, o que é mais do que natural e sempre tem de prevalecer o interesse do artista, a sua mensagem. O curador que está lidando com o artista vivo tem a possibilidade de discutir, de criar um embate entre curador, obra e artista. Se torna um pouco mais complexo, na verdade.

N – Sem um interlocutor como, de que forma você alicerça o seu pensamento, a sua pesquisa?

Resende – Temos vários interlocutores, todas as pessoas que apreciam a obra de Leonilson. Está todo mundo esperando e é uma obra muito conhecida também – o que cria uma certo grau de responsabilidade, é preciso ser bem cuidadoso. O meu convívio com Leonilson vem de longa data, desde 1996. Eu não o conheci vivo, embora já tenha lidado com a obra em 1986. Entrei em contato com ela pela primeira vez na exposição no Museu de Arte Contemporânea (MAC), da Universidade de São Paulo (USP). Depois, logo após a morte, em 1993, organizamos uma mostra no mesmo museu com curadoria do Agnaldo Farias. Ali realmente tive um embate com a obra pela primeira vez. Fui à casa de uma das irmãs buscar os trabalhos que saíam pela primeira vez depois do falecimento. Foi algo difícil. Mesmo sem conhecer o histórico do artista, já senti uma carga muito forte naquela obra, naquele gesto de estar de certa forma devassando esse universo guardado na casa da irmã.

N – A partir disso você se envolve…

Resende – Fui convidado pela Lisette Lagnado em 1996 para substitui-la na coordenação do Projeto Leonilson depois da primeira grande exposição retrospectiva do artista em São Paulo, no Serviço Social da Indústria (Sesi), em 95-96. Ela decidiu sair e me convidou para coordenar as pesquisas. Desde então, estou ali, já há 11 anos. É forte essa experiência principalmente no começo quando eu estava descobrindo a obra e tinha muito a fazer. Comecei a abrir os arquivos, o material que estava lá. Pesquisei em coleções particulares, em coleção de objetos, de artesanato, cartas, livros. Aquilo foi muito forte, na verdade eu senti o artista. Muitas vezes, estava lá sozinho mexendo nestes arquivos e batia algo forte e eu tinha de ir embora, porque não agüentava a carga.

N – Sentir o artista, como assim? Trata-se de uma relação mediúnica?

Resende – Não diria. Ler as cartas, os escritos, encontrar nos livros desenhos…Muitas vezes mexíamos nos livros para organizar a biblioteca e encontrávamos um desenho, uma carta, um bilhete. Isso tem uma carga muito forte para quem está começando a criar um embate. Ia embora porque realmente não agüentava o peso.

N – O Projeto Leonilson conseguiu fazer uma inserção de obras no mercado de arte nacional e internacional. Quais foram as estratégias para consolidar essa meta?

Resende – Isso é o próprio Projeto Leonilson, criado com a finalidade de organizar um catálogo raisoné. Pequisar, disseminar e divulgar fazem parte das políticas do Projeto, dar continuidade à circulação da obra. Uma das estratégias é essa. Começamos com o Centro Nacional de Arte e Cultura Georges Pompidou (Paris), que finalizou no ano passado, conseguimos colocar na Tate Modern (Londres). No Brasil, o primeiro museu a receber uma doação da família foi o Museu de Arte Moderna (MAM/SP). Eu trabalhava no MAM nesta época e estava indo para o Projeto Leonilson, o que ajudou, facilitou essa primeira doação, a mais significativa até ali. Era um desejo da família, havia uma vontade de organizar uma exposição, doar algumas peças para Museu Centro Dragão do Mar e era sempre frustrado por impossibilidades administrativas, financeiras. Agora, estando no Ceará, dirigindo a instituição, com a minha ida no ano passado, conseguimos fechar o assunto e doar 17 obras entre bordados, desenhos e pintura. O trabalho continua. Agora, estamos numa etapa delicada, negociando com um museu grande de São Paulo a incorporação do Projeto por essa instituição.

N – Qual é a razão que determina essa decisão? Dificuldades financeiras?

Resende – Não. Para ter melhores condições museológicas, de preservação deste legado e também para facilitar a finalização do catálogo raisoné. Também obviamente com essa parceria a obra terá maior visibilidade.

N – A família do artista em certas situações constitui-se em problema. Não é o que se percebe no caso de Leonilson. Como é a relação família x Projeto Leonilson?

Resende – O Projeto começa com a família e os amigos, eles sempre deram muito apoio. A primeira sede foi um apartamento de uma irmã, esse primeiro momento foi solucionado em família. Eles são bastante envolvidos cada vez mais, principalmente a presidente. Cada vez mais me surpreendo com a presidência da Nicinha, como ela vem se desenvolvendo não só administrativamente, mas também conhecendo a obra do irmão. Para eles, a família como um todo, a obra era também um mistério. O Projeto neste sentido está bem-sucedido, a família dá apoio para a manutenção.

N – Como a família deve considerar o valor da obra no mercado? É uma questão secundária?

Resende – Não. É uma realidade. A valorização das obras do artista é uma conseqüência natural do trabalho no Projeto Leonilson. Claro que quando se consegue colocar um artista em grandes museus internacionais, como o Moma, a Tate Modem ou o Georges Pompidou, como ocorreu recentemente, agrega-se valor à obra, é indiscutível. A família está bem consciente. Eles têm os próprios trabalhos, quando decidem vender, vendem da própria coleção. Quando é para a manutenção, pegam do legado que está sob a guarda do Projeto. Mas só vendem nestas condições, desconheço que estejam vendendo de forma leviana, vamos dizer assim. Tem muita obra de Leonilson no mercado, nas galerias de São Paulo principalmente.

N – Vamos falar de Florianópolis e da importância desta primeira mostra de Leonilson no Sul do Brasil?

Resende – A exposição nasce a partir do interesse do Museu Victor Meirelles, da diretoria e da assistente de diretoria, Aline Dias, que conhece muito bem a obra cujo trabalho tem até uma afinidade conceitual. Esse interesse veio ao encontro das propostas de divulgação do Projeto. Além de colocarmos Leonilson em alguns acervos, também apoiamos iniciativas. As pessoas podem contar com o nosso apoio e trabalho.

N – Qual o conceito de sua curadoria?

Resende – A Aline deu o mote, o de ser desenhos prioritariamente por ser um espaço pequeno e já ter um perfil nesta linha. Já tínhamos uma exposição meio pronta do ano passado, quando fiz uma co-curadoria com a curadora do espaço Fundeb, em Buenos Aires. Fiz uma adaptação daquela mostra, acrescentei e retirei alguns trabalhos pensando num tema bastante atual e curioso, que é o proposto pela 27ª Bienal de Arte de São Paulo. Dá para olhar a obra de Leonilson também por esse viés que é “Como Viver Junto”. É um pouco da primeira pergunta desta entrevista, onde está o homem na obra de Leonilson? Está o tempo todo presente neste desejo de comunicação, de convivência. Se observarmos algumas obras perceberemos sempre o um, o dois, o duplo, essa busca do outro que vem bem a calhar com a discussão da Bienal. Foi fácil, na verdade.

N – Como é dirigir uma instituição como o Museu de Arte Contemporânea Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, que ganhou tanta visibilidade, sobretudo, nos últimos anos?

Resende – O museu naturalmente já tinha uma grande importância, sempre teve uma boa repercussão desde a sua criação em 1999. Foi um desafio muito grande. Nunca tive a experiência de dirigir um museu. Quando vi na internet aberta a seleção para o próximo diretor curador pensei: “Está na hora de eu experimentar, vou tentar, não custa”. Mandei o currículo e, para a minha surpresa, tinha um conselho formado pelo Agnaldo Farias, Rodrigo Moura e Moacyr dos Anjos, pessoas que conheço, que já acompanhavam meu trabalho. Mas entendi que a escolha recaiu acima de tudo sobre o meu currículo, que era técnico, de diretor de museu. Trabalho quase 20 anos nesta área, atuei durante oito anos no MAC/USP que considero a minha escola, meus anos formativos. Depois trabalhei oito anos no MAM, onde pude aplicar o que aprendi no MAC/USP. No MAM também foi uma grande experiência, muito rica. Comecei lá quando o museu era muito pequeno, só com três funcionários na área técnica: a diretora, a curadora executiva e eu como assistente dela para tudo. Então, fazia o serviço educativo, visitas teleguiadas, montava exposições e ajudava na divulgação. Fazia de tudo ali, mas foi muito bom, porque cria-se um dinamismo e só assim, na prática, a gente consegue. E na gestão do Ivo Mesquita, diretor técnico, ele me jogou como curador da instituição. Veio a calhar a proposta de trabalhar em Fortaleza, onde agora posso aplicar todo um conhecimento técnico que aprendi nestes anos todos. E está sendo muito gratificante. Encontrei o museu com uma estrutura muito boa, prédio, funcionários com muita vontade de aprender. Tenho uma carga a oferecer a eles. Acho que foi isso, um casamento. Tive e tenho muito apoio da presidência do Centro Dragão do Mar que permite implantar algumas coisas. Conseguimos colocar realmente o museu no circuito nacional, ele é uma referência hoje. É fruto do trabalho de uma equipe.

N – Como você definiria a sua gestão? Qual seria a sua marca?

Resende – É técnica. Ao chegar, encontrei um museu sem acervo, pouco dinheiro para funcionar, um corpo de funcionários pequeno e ainda não treinado, sem experiência museológica. Então, já que não tínhamos acervo, a primeira coisa a ser feita foi valorizar o acervo sob sua guarda, o da Pinacoteca do Estado. Decidimos inicialmente trabalhar a coleção com mais de 900 trabalhos de Antônio Bandeira, um artista referenciado do Ceará. Depois passamos a trabalhar a equipe, organizar cursos, de catalogação, de conservação da obra s/ papel, pintura, de arte contemporânea, s/ tecido, já que a coleção de Leonilson estava chegando, vinha um bordado. Valorizamos a arte-educação, convidando a Denise Grinspum, diretora do Museu Lasar Segal, para da um curso. Montamos dois cursos de montagem de exposição. Além de pensar na preparação da equipe, os abrimos para a comunidade. Começamos também um trabalho forte de formação de acervo, doações, caso contrário aquilo ali não seria um museu, seria uma galeria. Essa foi nossa política cultural no primeiro ano. Tínhamos 55 obras quando cheguei há dois anos, hoje estamos em torno de 400. Criamos um acervo e continuamos num ritmo intenso. Conseguimos, então, implementar uma agenda de exposições, fizemos parcerias com outras instituições para justamente fugir, às vezes, da nossa carência financeira. Neste ano conseguimos dois editais, o da Petrobras e o da CEF. Com os R$ 200 mil da Petrobras, montaremos a reserva técnica num espaço muito generoso, onde estão as obras, mas não temos equipamentos ainda. Com o apoio da CEF, investiremos em aquisição de acervo. Nosso projeto foi aprovado na íntegra, R$ 470 mil, o de maior valor aprovado. Vamos adquirir obras principalmente de um outro artista do Ceará, o Sérvulo Esmeraldo, que é do período construtivo. Estamos acertando uma grande coleção de 30 trabalhos, entre gravuras, desenhos e esculturas para formar um núcleo dele lá dentro. Temos um núcleo de 17 obras do Leonilson, ganhamos uma grande coleção do Luiz Hermano, outro cearense importante. Ele doou 29 trabalhos entre esculturas, objetos, instalações, gravuras e desenhos. O Efrain Almeida, outro cearense, e artistas locais, também estão inseridos dentro deste edital. A idéia desta primeira aquisição é formar um núcleo forte em torno do Sérvulo e do Leonilson, estamos pensando prioritariamente nos anos 80 para contextualizar o Leonilson, o seu período formativo no Ceará, onde ele freqüentou bastante. Estamos agora catalogando o acervo.

N – Você ampliou a equipe?

Resende – Não. Eu lido com pessoas muito jovens. O meu assistente, o meu braço direito tem 23 anos. A coordenadora do centro educativo tem 30 anos e os demais também são da faixa dos 20. Eles têm muita energia e vontade de aprender. Acho incrível, porque nesta idade eu não tinha a mínima idéia do que seria trabalhar num museu, estava no nordeste, em Canoa Quebrada. Num museu é outro espírito, muito mais responsável e isso me anima muito, assim como pensar que em torno deste trabalho já há uma nova geração de artistas para quem aquele espaço foi importante no final dos anos 90 e no começo do século 21. O Alpendre, um espaço alternativo que tinha a função de contrapor o museu, o oficial, ajudou a criar uma cena contemporânea muito forte em Fortaleza. Estamos colhendo os frutos, o museu funcionando, uma nova geração de artistas, uma interlocução com outras gerações de artistas – um dinamismo que a partir de agora é só continuar.

N – O fato de, no Brasil, a crítica e a curadoria serem exercidas geralmente pelas mesmas pessoas é positivo? Agrego a essa questão o fato de surgir novos nomes na crítica brasileira…

Resende – O que percebo é que em São Paulo e no Rio de Janeiro tem surgido uma nova geração de críticos, os que editam a revista “Número”. Eles, por exemplo, estão envolvidos com a crítica, querem fazer. No Ceará, estimulo os que trabalham comigo, que comecem também a escrever textos sobre as exposições. Hoje escrevem, é assim que se formam, você dá tarefas para as pessoas escreverem e refletirem sobre arte. Em São Paulo tem surgido uma nova geração de pessoas muito reivindicativas de um espaço. Com o tempo isso vai mudar, distanciando a situação vivida especialmente nos anos 90, quando houve uma total ausência de crítica na imprensa. O que eu percebi foi um movimento de quem tinha o potencial para ser crítico de arte – que é uma coisa – desejando ser outra, que é ser curador. Acabamos perdendo algumas pessoas que tinham um perfil perfeito para a crítica ou para a curadoria. Por exemplo, a Angélica de Moraes é a nossa melhor crítica ainda hoje, no entanto, ela tem interesse maior em fazer curadoria. É uma pena. Na verdade, ela podia ser ainda uma grande crítica, a contribuição dela seria maior.

N – O que define o exercício crítico?

Resende – Escrever, vivenciar o meio artístico e a partir desta vivência refletir sobre a produção atual. Seria contextualizar os movimentos percebidos hoje na arte.

N – E comparando esse exercício com a curadoria, qual seria o diferencial?

Resende – Refiro-me à crítica de jornal. O que falta hoje é uma crítica jornalística. Obviamente que o curador também é um crítico no sentido de refletir sobre a produção. O curador tem outra função. O crítico tem a função de escrever, a sua reflexão é escrita. A do curador se dá no espaço da exposição, na organização de um olhar num espaço físico. O crítico é esse outro que deveria estar no jornal, na televisão, nos seminários fazendo reflexões por escrito.

N – Você também faz crítica?

Resende – Não necessariamente da maneira que estou falando. Escrevo textos para artistas, catálogos, mas não sei se esses textos poderiam ser encarados como crítica, acho questionável. Você acaba muitas vezes escrevendo por afinidade, por amizade, mais do que um envolvimento com a obra em si. É bem complicado hoje, você percebe um certo vazio nestes textos de curadores, de críticos em catálogos. Fico um pouco ansioso de estar fazendo justamente isso.

N – Vazio em que sentido?

Resende – De informação acima de tudo. Falta objetivo muitas vezes. A quem se destinam esses textos? Ao próprio artista? É para o ego do artista? Apenas para preencher um espaço no catálogo ou será que deveria visar a um público que nunca se atinge e no qual nunca se pensa ao escrever? Muitas vezes é pura verborragia, textos herméticos cheios de conceitos que não passam nada para o leitor. A crítica deveria traduzir, transpor as informações dos artistas, que a obra retêm para o público, o leitor do jornal, da revista, do catálogo. A gente não percebe esse interesse.

N – A curadoria da Bienal de Arte de São Paulo faz uma mudança na curadoria ao convidar um curador chefe e mais cinco assistentes. Faz um deslocamento para neutralizar o poder da figura do curador. Como você vê as idéias da Lisette Lagnado, curadora-chefe, para a Bienal?

Resende – Muito legal o novo formato para a escolha do curador. É um pouco também como foi a escolha do diretor do Museu Centro Dragão do Mar. A minha escolha também foi desta forma, democrática, não por indicação, por uma análise de currículo, de trabalho. Lisette foi escolhida por seu trabalho. Isso é muito rico, com grandes possibilidades de dar certo. Você convida quatro pessoas para apresentar propostas de curadoria coletiva, que não ficasse apenas numa única, centralizada. Isso deu muita liberdade para a Lisette pensar uma proposta bastante ousada, esse assunto. A escolha do curador da Bienal e a minha seleção no Ceará sinalizam uma uma nova fase, uma nova etapa para escolher curadores e diretores de museus. Podia ser assim, com seleções abertas e com análise de currículos para se ter profissionais que atendam o perfil e as necessidades das instituições. A Bienal depois da experiência passada com uma curadoria única, centralizadora, não sei se foi tão desastrosa quanto dizem, mas questionável, obviamente, com relação à de agora, que tem um perfil democrático, aberto. É muito melhor várias pessoas, vários olhares, confluindo para uma coisa só. É impossível pensar sozinho hoje – tem muito artista, muita gente produzindo e o mundo é muito grande, é impossível uma única pessoa dar conta de algo como a Bienal que precisa abranger a produção mundial. Tem mesmo que dividir o serviço, é muito trabalhoso organizar uma exposição deste porte. Fica mais rico, há mais trocas e mais chances de dar certo.

N – Essa abertura e multiplicidade de olhares você já tratou de incorporar no Ceará?

Resende – Sim, todo mundo participa, faz curadoria. Meus assistentes fazem pequenas curadorias, estou ali junto só para solucionar problemas. Mas estou jogando eles adiante, para se tornarem profissionais. Vivemos esse momento importante, temos autonomia dada pela presidência que nos permite experimentar, o que é necessário para a arte contemporânea, espaços que também experimentam administrativamente.

Texto originalmente publicado no site www.netprocesso.art.br