INSTITUTO BRASILEIRO DE MUSEUS

Museu Victor Meirelles

n. 4 – Escritos da artista

Revista Eletrônica um ponto e outro nº 04 – Fabiana Wielewicki

Revista do programa de exposições do Museu Victor Meirelles

Escritos da artista

1. Pendurar horizontes de papel nas vidraças e contemplá-los com devoção para um retrato. 2. Esperar que da estampa de um pôr-do-sol irradie certa luz avermelhada capaz de aquecer o dentro de casa nublado. 3. Sentar-se no chão da sacada para fitar o horizonte numa fotografia azul-desbotado (e alienar-se do que passa na cidade). 4. Fingir ignorar o mar diante de um livro-escudo. 5. Desejar o mar diante de um livro-portal. 6. Emendar folhas de paisagem em outras paisagens. 7. Forjar cenas e recantos de segunda natureza para estar. (E tudo se conforma na superfície da fotografia).

(texto da artista, apresentado no convite da exposição 2ª natureza, Museu Victor Meirelles, 2007)

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Em casa.

Ao acordar espio o dia e fecho a cortina. O panorama de janelas comerciais esvazia minha idéia de paisagem. É neste vão, entre os escritórios e o idealizado, que ás vezes instalo horizontes de papel.

No quarto, a cortina verde de tecido fino permite a luz do dia dentro e me resguarda da vista de escritórios. O verde quase amarelado que o recinto assume é confortante. A cortina “black-out”, que fica escondida atrás da verde, me desagrada por ser de plástico. Não me livro dela para garantir o sono (o centro da cidade fica muito aceso à noite).

Na sacada, me alegro com a floreira. As mudas que planto não florescem como eu gostaria. Só as babosas nunca se ressentem com períodos sem água. Isso me tranqüiliza, e garante o verde sempre à vista. O concreto aparente ocupa a extensão horizontal da sacada e sobe até a altura da cintura. Quando me sento só vejo cinza escuro.

Do outro quarto (escritório doméstico), vê-se bem de perto algumas salas comerciais do edifício vizinho. As janelas são amplas lá, e me fazem cúmplice da rotina de trabalho alheia. A veneziana deste quarto é escura, por isso só a fecho em dias muito claros (é triste trabalhar na penumbra ou sob luz fria quando é dia).

Fotografias de céu e mar me confortam, como as flores que gostaria de ter na sacada. Contemplar horizontes tranqüilos e inacessíveis é um exercício meditativo que me faz feliz.

Na praia.

Ouvir o mar faz bem ao espírito. Sua imagem ganha potência quando o escuto. Ultimamente não consigo presenciá-lo (mesmo diante dele), apenas a sua imagem.

Na sacada de casa pendurei um pôster desbotado de paisagem marinha e o contemplei com devoção para um retrato. Emocionei-me diante de um livro com fotografias de viagens marítimas para o mesmo fim.

Impossível contemplar o mar sempre que se deseja.

No trabalho.

Moro e trabalho no 8º andar de um edifício no centro da cidade. Daqui da “ilha” vejo a cidade lá em baixo e escritórios ao redor (não vejo o mar). Fotografo improvisando cenas que romantizam o convívio neste ambiente.

Nos últimos meses, as idéias que geram trabalhos tomam forma a partir do ócio doméstico: tardes de leitura na rede, cafés na sacada apreciando a vista, conversas com os gatos, cuidados experimentais com as plantas…

Estar conceitualmente cercada de mar tem me intrigado. Certa temporada em outra cidade me fez ver que esta condição faz parte da minha idéia de mim mesma.

Habitar uma ilha é uma imagem muito poética.

Comecei a fotografar o mar na tentativa de potencializar a presença assumida por ele na minha concepção de mundo privado. Tento trazê-lo pra casa com imagens. Estreitar a convivência. Na superfície da fotografia muitos anseios se aquietam.

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2005: Mestre em Artes Visuais, Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, Porto Alegre, RS.
2001: Bacharelado em Artes Plásticas, Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC, Florianópolis, SC.