INSTITUTO BRASILEIRO DE MUSEUS

Museu Victor Meirelles

n.4 – Depoimentos

Revista Eletrônica um ponto e outro nº 04 – Fabiana Wielewicki

Revista do programa de exposições do Museu Victor Meirelles

Depoimentos

“Não basta abrir a janela
Para ver os campos e o rio”

Alberto Caeiro

Aprendi com a Fabiana que as janelas não limitam, mas enquadram.Quando me aproximo de janelas, lembro dela. O recorte na paisagem, cortinas sem paisagem, montagens de paisagens. Conheci Fabiana na Universidade. Lembro de que no final do curso, Fabiana num gesto preciso com um estilete afiado recortava fotografias de um mesmo prédio, realizadas a partir da sua janela, e as emendava. Penso que Fabiana continua fazendo emenda de paisagens. Há algo entre ela e cidade que se configura pelo enquadramento da janela e visor de uma câmera ou visor da câmera como janela. Durante um período posterior de nossas vidas nossas janelas se alinhavam. Morávamos sozinhas em Porto Alegre. Ela no terceiro e eu no sétimo andar do mesmo prédio. A altura configurava cidades diferentes no bairro Cidade Baixa. A solidão nos aproximava. O trajeto intenso entre a minha casa e a dela era intermediado pelo elevador, que conectava as alturas. E ela, naquele momento, intrigada com as distâncias, fotografias, cidade, paisagem, janelas e trajetos a partir de pensamentos gambiarras elaborou uma outra janela a partir das fotografias de nossas janelas. Fico intrigada com a habilidade de Fabí para gambiarras. Mas diante do seu último trabalho, me sinto envergonhada. Pareço um voyer. Um voyer que entre as cortinas de um apartamento no 8º andar ou numa praia espia uma menina vestida de azul contemplando imagens de paisagem. Parece uma menina doce. É constrangedor invadir um momento imaculado, tão dela, sozinha com seu livro portal. Mas de repente me lembro que todo aquele ambiente foi arranjado, e daí gosto do gosto do engano, da fotografia, da armadilha sedutora de Fabiana.

Letícia Cardoso de Brito
artista

Conheci a Fabiana em 2002 durante uma viagem a Belo Horizonte da qual também participaram outros artistas, como a Glaucis de Morais e a Letícia Cardoso (e surgiram daí algumas histórias engraçadas sobre as pousadas de Ouro Preto). Alguns dias depois, reencontramo-nos na seleção para o mestrado em Porto Alegre e nos tornamos então colegas. Nestes cinco anos voltamos mais uma vez a ser colegas, desta vez como professoras, por um breve período, na UDESC, em Florianópolis. Durante o período de Porto Alegre, Fabiana trabalhou intensamente, chegamos a realizar uma exposição juntamente com a Glaucis na Pinacoteca da Feevale, “Entre dois Pontos”, e o trabalho “Indicadores” durante um dos Fóruns Mundiais. Acredito que o mestrado e também o fato de estar sozinha em uma cidade diferente contribuiu em muitos sentidos ao trajeto tomado pelo seu trabalho. A relação entre a artista, a fotografia, a cidade, o seu espaço (mesmo que pequeno!) ficou cada vez mais evidente, numa espécie de conversa irônica com as baixas tecnologias (neste período ela explorou o slide, um sofisticado backlight de luz de janela e, claro, a curiosa máquina fotográfica Autostar Pocket) o que agora parece reverberar nestes novos trabalhos apresentados em 2ª Natureza, uma característica que é tanto da personalidade da artista quanto de seu trabalho, este humor sutil e auto-irônico.

Mariana Silva da Silva
artista e professora do curso de Artes Visuais da Universidade de Caxias do Sul

Conheci primeiro a obra e depois a artista. Se não me engano foi no MASC e a obra era o “Auto-retrato na torre”. Lembro que fiquei bastante tempo tentando descobrir um significado. “Mas que diabos se quer com essa torre?”. Gostei muito porque me intrigava. Algum tempo depois foi realizada, no mesmo espaço, a exposição Pretexto Poético. Estes trabalhos também circularam por várias cidades de Santa Catarina. Fabiana era uma das artistas presentes nessa exposição itinerante. Eu estava envolvido nesta circulação. E houve uma mesa crítica para analisar os portifólios e propostas de exposições de artistas catarinenses, que participariam de um circuito de artes realizado pela Instituição na qual trabalho. Não lembro exatamente o ano, mas era 2003 ou 2004. A Fabiana era uma das pessoas que tinham sido escolhidas para a análise. Foi a primeira vez que conversei e conheci mais a artista do “Auto-retrato na torre”. No ano seguinte, em outra mesa de análise, o trabalho da Fabiana foi selecionado para circular as cidades catarinenses, durante três anos. Era a exposição Segredos da Boa Fotografia em conjunto com uma oficina sobre fotografia artística. Realizar exposições, concertos, espetáculos com artistas jovens é diferente daqueles que têm uma trajetória. As preocupações são maiores, sim. Mas na primeira exposição e oficina realizadas pela Fabiana, os artistas e o público manifestaram-se de forma muito favorável ao trabalho. Assim continuou na segunda cidade, na terceira… As pessoas falavam que Fabiana tinha um trabalho consistente, uma boa base teórica e uma forma ímpar de lidar com o público. E aconteceu de a Fabiana ser convidada para fazer parte da equipe de assessores do projeto Pretexto. No início, nas primeiras cidades em que ela foi, havia o acompanhamento do artista e assessor Fernando Lindote. Hoje aqueles Pretextos que têm enfoque na fotografia são realizados pela Fabiana, sempre com trabalho consistente. Fabiana é a artista da obra que me intriga. A Fabiana também é marioandradina: aquela que vive nas incursões aos campos e arredores desta província de Santa Catarina, num trabalho sacerdotal de auxiliar a pensar e ver a obra de outros artistas. E, nestas viagens, ela descobre a sua própria obra; trazendo uma especiaria colhida no Oeste, uma idéia descoberta no Sul e novo mar azul fotografado no Norte.

Valdemir Klamt
Setor de Cultura – SESC SC

Olhar a paisagem da janela, abrir e fechar a cortina. Daquele ângulo não se vê o horizonte. É deste ponto de vista que Fabiana inventa paisagens para serem contempladas.

Desde que conheço a Fabiana, há oito anos, quando foi aluna do curso de Artes Plásticas na UDESC, uma coisa me chamava e me chama muita atenção, sua capacidade de inventar e rearranjar coisas. Este gesto de “gambiarriar” aparece agora nestas paisagens que descortinam uma outra possibilidade de contemplar o horizonte no mar.

Nara Milioli
artista e professora do curso de Artes Plásticas do
Centro de Artes da Universidade do Estado de Santa Catarina

Posso olhar para os trabalhos inicias de Fabiana e perceber um esforço em dominar meio e linguagem ao mesmo tempo em que escolhe algumas questões a partir das quais ela poderá estabelecer um plano de discussão em seu processo.

Os trabalhos que vão sendo apresentados nos anos seguintes parecem perseguir com afinco um entendimento paulatinamente mais sofisticado do seu repertório de problemas. Na distância entre uma obra e outra, as voltas da linguagem realizadas por Fabiana se esgarçam com delicadeza, mas de um tipo de delicadeza analítica e corrosiva em relação ao objeto focado por seu pensamento, não raro ela mesma e seus métodos de construção da imagem. Nesse sentido Os Segredos da Boa Fotografia é um momento agudo de avaliação de seus meios.

Os trabalhos posteriores apresentam um tipo de maturidade muito particular, como se depois do enfrentamento d’Os Segredos, Fabiana retomasse a produção com um outro tipo de sabedoria: mais distanciada e irônica. Um humor novo surge cada vez mais de suas imagens. E nunca como agora, ela aparece tão ausente em seus auto-registros.

Fernando Lindote
artista