Em 21 de novembro de 2004 Clara Allain publicou na Folha de São Paulo uma tradução de entrevista inédita de Michel Foucault ao Le Monde, após a publicação de As Palavras e as Coisas, em 1966. Abaixo, tomamos a liberdade de reproduzir a tradução (por tratar-se de um texto inédito), com as devidas referências.
A palavra nua de Foucault
“Eu compreendo, também, porque as pessoas sentem minha escrita como uma agressão. Elas sentem que existe nela alguma coisa que as condena à morte. Na realidade, sou bem mais ingênuo do que isso. Eu não as condeno à morte. Simplesmente suponho que já estejam mortas. É por isso que me surpreendo quando as ouço gritar. Fico tão espantado quanto o anatomista que sentisse redespertar de repente, sob a ação de seu bisturi, o homem sobre o qual pretendia fazer uma demonstração. Bruscamente, os olhos se abrem, a boca se mete a gritar, o corpo a se retorcer, e o anatomista se espanta: “Então ele não estava morto!”.
Acho que é isso o que acontece comigo em relação àqueles que me criticam ou gritam contra mim, depois de me haver lido. Sempre é muito difícil para mim responder a eles, exceto por uma desculpa, desculpa que eles talvez interpretem como ironia, mas que, na realidade, é a expressão de meu espanto: “Então eles não estavam mortos!”.”
Michel Fucault à Claude Bonnefoy. Entretien interprèté par Eric Ruf et Pierre Lamandé. CD à voix haute théâtre. . Paris, Editions Gallimard/France Culture, 2006