Antonio Vargas
Encontrava-me fora do país quando da abertura da exposição de Renata de Andrade. Quando por fim pude visitá-la deparei-me com a Greve Nacional da Cultura e o cartaz do Sintrafesc-Iphan na porta de vidro fechada do Museu Victor Meirelles. Ao princípio me senti frustrado, mas ali fiquei encostado a porta, olhando através do vidro os trabalhos em seu interior. Cerca de quarenta minutos após despertei de um sonho acordado. Percebi então que me encontrava imerso no desfrute furtivo, quase proibido de um conjunto de imagens profundamente envolventes apesar de sua aparente simplicidade. Encantado com as relações poéticas criadas entre o graffiti e o decorativo, entre a cor pintura e a cor objeto de embalagens cotidianas tantas vezes manipuladas na limpeza da casa e do atelier. Embalagens que de forma simples organizadas no espaço instalavam-se redefinindo o próprio uso do espaço. Embalagens escultóricas que me forçavam a rever o olhar displicente utilizado no dia a dia na cidade. Igualmente as pinturas sobre cartão me arrancavam da memória lembranças infantis de encantamento com estampas de embalagens, de caixas de presente que eu julgava ainda existirem mas as quais não sabia onde se ocultavam. Foi então que percebi que na verdade, o fato da porta estar fechada me havia feito encostar displicentemente ao vidro e assim, sem sentir, suavemente penetrar no espaço da exposição. Por quarenta minutos aproximadamente transpus o vidro sem que nenhum alarme soasse. Apenas o som da minha respiração suspensa pelo prazer do olhar. Para mim isto não é pouco, principalmente quando a obra serve-se de materiais tão utilizados na arte contemporânea que o próprio ato de valorizar o banal o banaliza ainda mais. Neste sentido a obra de Renata de Andrade surpreende pois tira do espaço do museu o máximo para um convite a intimidade do olhar. É um raro prazer.